Desconhecido em sua terra, poeta paraibano...
Desconhecido em sua terra, poeta paraibano faz 89 anos e é festejado pelo povo do Maranhão
ZÉ EUFLÁVIO
O poeta
paraibano José Chagas está completando 89 anos e recebeu diversas
homenagens do povo do Estado do Maranhão, onde mora desde a década de 40
do século passado. A Academia Maranhense de Letras, onde ocupa uma
cadeira, reeditou o livro Colégio do Vento.
Chagas não é
conhecido na Paraíba. Seus pais mudaram-se para o Maranhão muito cedo e o
poeta ficou esquecido por aqui. Ele nasceu em Santana dos Garrotes, no
Sertão da Paraíba, e é considerado um dos maiores poetas brasileiros da
atualidade.
Veja esta entrevista que ele concedeu a Jorge Nascimento, no Maranhão.
Reproduzimos
esta entrevista, considerando o caráter de atualidade que a percorre,
principalmente em se tratando das concepções que o poeta tem de vida e
poesia.)
Jorge Nascimento – Fale-nos um pouco de sua vida.
José Chagas
– Nasci num pequeno sítio chamado Aroeiras, no distrito de Santana dos
Garrotes, que hoje passou a município, no Estado da Paraíba. Foi nesse
chão que vivi a minha infância e a minha adolescência, desde cedo
plantando e cuidando do cultivo da terra, pois meus pais eram
lavradores. Viver a infância é aqui um modo de dizer, porque, em
verdade, eu não tive muito tempo de ser menino. De certo modo, já nasci
adulto, por força do trabalho duro do campo. Aos sete anos já estava com
minhas mãos calejadas nas tarefas que me cabiam, durante a semana
inteira. De manhã bem cedo, antes mesmo do raiar do sol, meu pai
despertava a mim e a meus irmãos, considerando que já era meio-dia e a
gente ainda estava dormindo. Ia-se então para o trabalho que era, como
se costumava dizer, de sol a sol. Assim, apesar de viver na roça, ou
então por isso mesmo, não tive aquela infância alegre e livre, uma
infância casimiriana, como a que eu leria mais tarde, no poeta romântico
de Meus Oito Anos.
JN – Quando você sentiu que era poeta? Em que momento surgiu esta certeza?
José Chagas –
Posso dizer francamente que, a rigor, nunca tive essa certeza de que
sou poeta, porque sempre me considero mais um simples fazedor de versos.
[...] As letras me impressionavam, enquanto outros garotos de minha
convivência não davam importância para isso. Sei ainda que, mesmo
vivendo em meio a uma realidade crua, eu nunca deixava de ser tocado por
um mundo de fantasia [...].
JN – Quais as primeiras influências literárias e as leituras marcantes?
José Chagas -
Como qualquer nordestino fui de início muito influenciado pela
literatura de cordel. Os violeiros e repentistas das feiras da minha
terra também contribuíram para o meu fascínio pelo ritmo e pela rima,
vindo daí a minha facilidade de versejar, a ponto de me ser mais fácil
escrever em versos do que em prosa. Nos primeiros tempos, só o cordel
foi minha leitura marcante. Tive muitas outras, mas depois. Até
literatura infantil só me foi possível ler quando já adulto, estudando
no ginásio. As circunstâncias fizeram com que tudo em mim, no campo
literário, chegasse com algum atraso.
JN –
Como se apresenta em sua mente a concepção do poema? Elabora um plano e
segue rigorosamente esse plano ou surge tudo espontaneamente, conforme a
inspiração?
José Chagas
– Apesar de cada livro meu ser um poema único, com exceção de dois ou
três, eu não me preocupo em elaborar um plano. [...] Em geral eu não
faço o poema, deixo que ele se faça e tome as formas que bem entender
como aconteceu com Os Telhados, Os Canhões do Silêncio, O Discurso da
Ponte, o poema sobre Alcântara e ou-tros. Acho que tudo se elabora
primeiro, interiormente, e eu não tenho que interferir em nada, depois.
[...]
JN – Como você define sua poesia?
José Chagas
– Acho que, de certo modo, já dei resposta a isso, quando falei que me
sinto apenas um fazedor de versos. Reconheço-me um poeta menor por ter
consciência da distância que vai de mim aos grandes poetas. Gosto de
lembrar, nesse caso, Fernando Pessoa, que distinguia o homem que é
realmente poeta de outro que é simplesmente um animal que faz versos.
Mas, a propósito de minha facilidade de versejar, acho que cabe lembrar o
que a meu respeito disse o crítico Wilson Martins, em artigo no Jornal
do Brasil, de 20 de setembro de 1980, descobrindo o que ele chamou de
paradoxo aparente: – O que impede José Chagas de ascender à condição
indisputável de grande poeta é a sua irreprimível destreza de
versificação, a espontaneidade com que faz o poema, a sua força natural
de exprimir-se ao contrário de tantos poetas (e dos mais famosos) [...]
JN – Fale do ambiente literário quando você chegou em São Luís?
José Chagas
– Cheguei em São Luís no fim da década de 40. Em 1948, para ser mais
preciso. Os poetas de que logo tomei conhecimento eram todos da velha
guarda, nomes consagrados no meio, como Corrêa de Araújo, Fernando
Viana, Assis Garrido, Manuel Sobrinho, Raul de Freitas, Clodoaldo
Cardoso, para só falar nos que ainda estavam vivos. [...]
O Maranhão, que
parecia ter ficado para trás, no cenário nacional, começava a
reencontrar-se e a retomar seu lugar de vanguardista na cultura do país.
Eu, que chegava como funcionário do IBGE, onde ingressei por influência
do meu amigo Antonio Justa, também intelectual que aqui viveu algum
tempo, não me introduzi logo no meio literário, o que veio a ocorrer só a
partir de 1950.
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