Desconhecido em sua terra, poeta paraibano...

22 novembro

Desconhecido em sua terra, poeta paraibano faz 89 anos e é festejado pelo povo do Maranhão

ZÉ EUFLÁVIO

O poeta paraibano José Chagas está completando 89 anos e recebeu diversas homenagens do povo do Estado do Maranhão, onde mora desde a década de 40 do século passado. A Academia Maranhense de Letras, onde ocupa uma cadeira, reeditou o livro Colégio do Vento.
Chagas não é conhecido na Paraíba. Seus pais mudaram-se para o Maranhão muito cedo e o poeta ficou esquecido por aqui. Ele nasceu em Santana dos Garrotes, no Sertão da Paraíba, e é considerado um dos maiores poetas brasileiros da atualidade.
Veja esta entrevista que ele concedeu a Jorge Nascimento, no Maranhão.
Reproduzimos esta entrevista, considerando o caráter de atualidade que a percorre, principalmente em se tratando das concepções que o poeta tem de vida e poesia.)
Jorge Nascimento – Fale-nos um pouco de sua vida.
José Chagas – Nasci num pequeno sítio chamado Aroeiras, no distrito de Santana dos Garrotes, que hoje passou a município, no Estado da Paraíba. Foi nesse chão que vivi a minha infância e a minha adolescência, desde cedo plantando e cuidando do cultivo da terra, pois meus pais eram lavradores. Viver a infância é aqui um modo de dizer, porque, em verdade, eu não tive muito tempo de ser menino. De certo modo, já nasci adulto, por força do trabalho duro do campo. Aos sete anos já estava com minhas mãos calejadas nas tarefas que me cabiam, durante a semana inteira. De manhã bem cedo, antes mesmo do raiar do sol, meu pai despertava a mim e a meus irmãos, considerando que já era meio-dia e a gente ainda estava dormindo. Ia-se então para o trabalho que era, como se costumava dizer, de sol a sol. Assim, apesar de viver na roça, ou então por isso mesmo, não tive aquela infância alegre e livre, uma infância casimiriana, como a que eu leria mais tarde, no poeta romântico de Meus Oito Anos.
JN – Quando você sentiu que era poeta? Em que momento surgiu esta certeza?
José Chagas – Posso dizer francamente que, a rigor, nunca tive essa certeza de que sou poeta, porque sempre me considero mais um simples fazedor de versos. [...] As letras me impressionavam, enquanto outros garotos de minha convivência não davam importância para isso. Sei ainda que, mesmo vivendo em meio a uma realidade crua, eu nunca deixava de ser tocado por um mundo de fantasia [...].
JN – Quais as primeiras influências literárias e as leituras marcantes?
José Chagas - Como qualquer nordestino fui de início muito influenciado pela literatura de cordel. Os violeiros e repentistas das feiras da minha terra também contribuíram para o meu fascínio pelo ritmo e pela rima, vindo daí a minha facilidade de versejar, a ponto de me ser mais fácil escrever em versos do que em prosa. Nos primeiros tempos, só o cordel foi minha leitura marcante. Tive muitas outras, mas depois. Até literatura infantil só me foi possível ler quando já adulto, estudando no ginásio. As circunstâncias fizeram com que tudo em mim, no campo literário, chegasse com algum atraso.
JN – Como se apresenta em sua mente a concepção do poema? Elabora um plano e segue rigorosamente esse plano ou surge tudo espontaneamente, conforme a inspiração?
José Chagas – Apesar de cada livro meu ser um poema único, com exceção de dois ou três, eu não me preocupo em elaborar um plano. [...] Em geral eu não faço o poema, deixo que ele se faça e tome as formas que bem entender como aconteceu com Os Telhados, Os Canhões do Silêncio, O Discurso da Ponte, o poema sobre Alcântara e ou-tros. Acho que tudo se elabora primeiro, interiormente, e eu não tenho que interferir em nada, depois. [...]
JN – Como você define sua poesia?
José Chagas – Acho que, de certo modo, já dei resposta a isso, quando falei que me sinto apenas um fazedor de versos. Reconheço-me um poeta menor por ter consciência da distância que vai de mim aos grandes poetas. Gosto de lembrar, nesse caso, Fernando Pessoa, que distinguia o homem que é realmente poeta de outro que é simplesmente um animal que faz versos. Mas, a propósito de minha facilidade de versejar, acho que cabe lembrar o que a meu respeito disse o crítico Wilson Martins, em artigo no Jornal do Brasil, de 20 de setembro de 1980, descobrindo o que ele chamou de paradoxo aparente: – O que impede José Chagas de ascender à condição indisputável de grande poeta é a sua irreprimível destreza de versificação, a espontaneidade com que faz o poema, a sua força natural de exprimir-se ao contrário de tantos poetas (e dos mais famosos) [...]
JN – Fale do ambiente literário quando você chegou em São Luís?
José Chagas – Cheguei em São Luís no fim da década de 40. Em 1948, para ser mais preciso. Os poetas de que logo tomei conhecimento eram todos da velha guarda, nomes consagrados no meio, como Corrêa de Araújo, Fernando Viana, Assis Garrido, Manuel Sobrinho, Raul de Freitas, Clodoaldo Cardoso, para só falar nos que ainda estavam vivos. [...]
O Maranhão, que parecia ter ficado para trás, no cenário nacional, começava a reencontrar-se e a retomar seu lugar de vanguardista na cultura do país. Eu, que chegava como funcionário do IBGE, onde ingressei por influência do meu amigo Antonio Justa, também intelectual que aqui viveu algum tempo, não me introduzi logo no meio literário, o que veio a ocorrer só a partir de 1950.
GiroPB.com

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