Condenado por atear fogo em índio no DF tem posse na Polícia Civil barrada

19 julho

Monumento em homenagem ao índio Galdino Jesus dos Santos, incendiado enquanto dormia em ponto de ônibus da W3 Sul, em Brasília (Foto: Lucas Salomão/G1)
O Tribunal de Justiça do Distrito Federal negou recurso do candidato aprovado em concurso da Polícia Civil, mas que foi desqualificado do certame por ser reprovado na etapa de sindicância de vida pregressa. Ele foi condenado em 2001 por participação no assassinato do índio Galdino Jesus dos Santos.
O crime aconteceu em 20 de abril de 1997, quando o candidato tinha 16 anos. Ele e outros quatro jovens de classe média de Brasília atearam fogo no índio, que dormia em uma parada de ônibus da W3 Sul.
Na época, o então adolescente foi encaminhado para um centro de reabilitação juvenil, condenado a cumprir um ano de medidas socioeducativas, mas passou apenas três meses internado.
Ele foi aprovado em todas as etapas de um concurso da Polícia Civil aberto em outubro de 2013. O rapaz havia superado as provas objetiva, física, médica, psicológica e toxicológica. O salário para o cargo de agente de polícia era de R$ 7,5 mil.

Depois de ser impedido de assumir a vaga, o candidato entrou com um mandado de segurança na 5ª Vara da Fazenda Pública do DF, que foi negado pelo juiz. A decisão mais recente se refere ao recurso impetrado na 4ª Turma Cível do TJ. A partir de agora ele só pode recorrer no Superior Tribunal de Justiça (STJ) ou no Supremo Tribunal Federal (STF).
Segundo o edital do concurso, realizado pelo Centro de Seleção e de Promoção de Eventos da Universidade de Brasília (Cespe/UnB), a sindicância da vida pregressa e investigação social avalia a idoneidade moral do candidato no âmbito social, administrativo, civil e criminal.
O requisito consta no edital como “indispensável para aprovação” no concurso e é avaliado por uma comissão formada pela direção da Polícia Civil.

Negado
No recurso, o candidato alegou que já pagou pela infração praticada e que por isso não seria lícito continuar punido “ad eternum” o que na prática iria significar pena perpétua, vedada pela Constituição. A defesa também disse que, após mais de 17 anos desde o fato e de 15 anos de cumprimento da medida de liberdade assistida, a exclusão do concurso seria inconstitucional e ilegal.
Na decisão, o relator da 4ª Turma Cível afirmou que o candidato aceitou as condições que constavam no edital do concurso, entre elas a possibilidade de sindicância da vida pregressa. Segundo o relator, o rapaz concordou com o item que contemplava a possibilidade de que o crime praticado contra o índio Galdino se tratava “de fato desabonador de sua conduta, incompatibilizando-o com o cargo de agente de polícia da carreira de Polícia Civil do Distrito Federal”.
Na sentença consta que não se trata de punição perpétua, pois a decisão apenas dá prestígio à “moralidade pública, levando em consideração fato trazido à tona em fase regular do concurso público, para cuja avaliação a autoridade pública está devidamente autorizada, não só por lei, mas também pelo princípio da moralidade constitucional, cabendo destacar, ainda, que o ato de não-recomendação, em si, se contém dentro dos limites da proporcionalidade e da razoabilidade, princípios que, igualmente, têm assento na Constituição da República”.

Crime
O candidato aprovado no concurso e outros quatro jovens foram condenados em 2001 por queimar vivo o índio Galdino, que dormia em uma parada de ônibus da Asa Sul. O crime foi cometido em 20 de abril de 1997. O índio tinha 44 anos. Os envolvidos fugiram após o crime.
Um homem que passava pelo local anotou o numero da placa do carro dos jovens e entregou à polícia. Horas depois, Galdino morreu. Ele teve 95% do corpo queimado – o fogo só não atingiu a parte de trás da cabeça e a sola dos pés.

Quatro anos após o crime, Max Rogério Alves, Eron Chaves de Oliveira, Tomás Oliveira de Almeida e Antônio Novély Cardoso de Vilanova foram condenados pelo júri popular a 14 anos de prisão, em regime integralmente fechado, pelo crime de homicídio triplamente qualificado – por motivo torpe, meio cruel e uso de recurso que impossibilitou defesa à vítima. Por ser menor, o jovem que passou no concurso da Polícia Civil foi condenado a um ano de medidas socioeducativas.
Galdino havia chegado a Brasília um dia antes de ser morto – 19 de abril, Dia do Índio. Ele participou de várias manifestações pelos direitos dos indígenas.
Condenados por crime hediondo, Max, Antônio, Tomás e Eron não teriam, à época, direito à progressão de pena ou outros benefícios. A lei prevê a liberdade condicional após o cumprimento de dois terços da pena. Em 2002, a 1ª Turma Criminal fez uma interpretação diferente. Como não há veto a benefícios específicos na lei, os desembargadores concederam autorização para que os quatro exercessem funções administrativas em órgãos públicos.
A medida permitia estritamente que os quatro saíssem do presídio da Papuda para trabalhar e retornassem ao final do expediente. A turma de juízes chegou a permitir que os quatro também estudassem. Como há proibição específica na Lei de Execuções Penais, o Ministério Público recorreu e conseguiu revogar a permissão de estudo para Eron Oliveira e Tomás Oliveira. Mesmo assim, eles continuaram matriculados e frequentando aulas em universidades locais, contrariando a decisão.
Em outubro do mesmo ano, três dos cinco rapazes condenados foram filmados bebendo cerveja em um bar, namorando e dirigindo os próprios carros até o presídio, sem passar por qualquer tipo de revista na volta. Após a denúncia, os envolvidos perderam, temporariamente, o direito ao regime semiaberto, que era o que permitia o trabalho e o estudo externos.

Em agosto de 2004, os quatro rapazes ganharam o direito ao livramento condicional, mas eles precisam seguir algumas regras de comportamento impostas pelo juiz no processo para manter a liberdade, como não sair do DF sem autorização da Justiça e comunicar periodicamente ao juiz sua atividade profissional.
Nordeste 1

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